Silvia Herszkowicz é psicanalista há mais de 10 anos e tem desenvolvido um trabalho com psicóticos tanto na análise individual como em grupo. Produzia o curta-metragem "O Diafragma da Alma", documentário vencedor do IV Prêmio Arthur Bispo do Rosário - CRP SP - Categoria vídeo, juntamente com sua filha, cineasta Thais Herszkowicz. O Diafragma da Alma fala sobre o vazio interior sofrido pelos pacientes esquizofrênicos, vazio este representado no documentário como um único foco de luz ao chão, iluminando-os em um círculo vazio onde suas vidas são representadas por gestos, contos, olhares, desenhos e revelações. Silvia tem consultório na Rua Pamplona, São Paulo. Para entrar em contato, seu e-mail é angel8000@terra.com.br
Para ver o vídeo: http://www.youtube.com/watch?v=0znS2ZxrAQg (com legenda em espanhol)
https://vimeo.com/33352291 (em HD)
https://vimeo.com/43633471 (com legenda em Inglês)
1-
Silvia, conte-nos do seu caminho profissional na clínica de
psicóticos, há quanto tempo trabalha com psicóticos e que tipo de
trabalho desenvolve?
Comecei a trabalhar nesta área há 10
anos observando o Grupo Vida, coordenado pela Dra Araceli Albino,
no Núcleo de Pesquisas Psicanaliticas na Vila Mariana.
No
início de meu trabalho com o grupo anotava todos os diálogos entre
pacientes e analistas, observando cada detalhe e o comportamento de
todos. Após este período de observação me senti pronta para fazer
parte deste grupo, trabalhando tanto individualmente quanto em grupo
com esses pacientes.
O
Grupo Vida segue até hoje como um grupo aberto para que os pacientes
possam falar e serem ouvidos, não há a obrigatoriedade de falar. Os
pacientes sentem-se a vontade para expor seus problemas, angústias,
medos, vergonhas e ao mesmo tempo ouvem os problemas dos outros, o
que eles dizem que lhes traz um certo conforto.
A
Dra Araceli, que fundou o grupo, sempre fez também a função de
conter os surtos que aconteciam com alguns pacientes através da
direção de tratamento que foi criando um método próprio. Todos os
pacientes além da terapia de grupo fazem também a terapia
individual( na clinica social da entidade) bem como o tratamento com
psiquiatras. Em grupo há um trabalho com arte terapia,, terapia
corporal , teatro, música e tudo que possa colaborar para a melhora
dos pacientes. Nada é obrigatório mas os resultados melhores vem
sempre com a integração grupo/individual.
2-
Freud acreditava não poder trabalhar analiticamente com pacientes
psicóticos devido a ausência de transferência, mas graças a
Lacan, sabemos hoje ser possível o trabalho clínico com o psicótico
porque há transferência. Como você observa essa transferência na
clínica e qual a qualidade desse tipo de transferência?
Na
realidade para trabalhar com a psicose o analista tem que estar
muito bem analisado para não se misturar com o conteúdo deste
paciente que tem seu inconsciente a céu aberto e muitos analistas
não aguentam esta situação porque este tipo de paciente é
completamente imprevisível e se por um acaso ele surta, o
psicanalista tem que dar conta deste surto, entrar no surto,
sustentar sua posição, ajuda-lo a sair do surto e depois dirigi-lo
para a realidade. Penso que se um analista de neuróticos tem AMOR DE
ANALISTA no caso da psicose é muito mais AMOR DE ANALISTA.. É uma
relação muito forte pois o paciente deposita toda a sua carga de
delírios, alucinações e vários outros conteúdos em cima de seu
analista e este analista tem que dar conta de tudo isto sem se
misturar com este paciente e jamais demonstrar medo, pois se há medo
da parte do analista o psicótico percebe , se aproveita disso e não
acontece a transferência.
3-
No seu ponto de vista, quais os pontos chaves na clínica da psicose
para que o trabalho analítico possa ser desenvolvido?
Vontade do paciente, vontade e
preparo do analista (tripé da psicanalise) para lidar com demandas
tão fortes destes pacientes, paciência para atender esse paciente
não somente em sessão, pois quando a transferência se faz ele vai
requisitar muito e o analista tem que atender dando limites mesmo que
ele não os siga.
4-
E o analista, que tipo de atributos especiais deve desenvolver para
praticar a clínica da psicose?
O analista tem que querer
atender este tipo de paciente mas também tem que estar bem analisado
para não misturar seus conteúdos com os dele e ter firmeza para
enfrentar seus surtos, seus delírios, suas alucinações para
coloca-lo na realidade. Há de ter a continência Winnicottiana e a
firmeza Lacaniana.
5-
Você acredita que a psicanálise venha a desenvolver novos recursos,
considerando um aumento de números dessa psicopatologia, para
futuramente lidar com a clínica da psicose de uma forma
institucional e mais abrangente?
Sinceramente não. Acho que no
Brasil,agora na contemporaneidade, a psicanalise ainda anda a passos
lentos e por ser um processo muito longo e individual é para poucos,
pois hoje as pessoas querem resultados imediatos, sendo neuróticos.
Com a clínica da psicose o processo é muito mais demorado.
6-
De que forma se maneja a metáfora delirante nessa clínica?
Entrando junto com o paciente
nessa metáfora delirante, e com ele argumentar se aquilo pode
acontecer na realidade ou não. O analista tem que perceber quais são
as potencialidades do paciente e dirigi-lo para tais potencialidades
e só assim será possível inseri-lo na sociedade.
7-
Quais as principais diferenças do trabalho analítico com neuróticos
e psicóticos?
Para os neuróticos o analista
trabalha no contra ponto do problema já o psicótico não tem esse
contra ponto, ele (psicótico) não consegue ir a lugar nenhum que
seja útil para si sem a ajuda do analista.
Muito obrigado Silvia, pela participação no nosso blog.